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O Sistema Único de Saúde (SUS) responde pelo atendimento da imensa maioria dos brasileiros
O Hospital Público Municipal (HPM), com o apoio da Prefeitura de Macaé e através da Secretaria de Saúde, entrou com uma solicitação junto à Agência Nacional de Saúde, que regulamenta os planos privados, questionando o porquê de Macaé ter uma rede extensa destes planos, mas não prestar atendimento eficiente em não ressarcir o sistema público municipal. Macaé está lutando por um recurso que é direito estabelecido por lei.
A constatação da necessidade do ressarcimento, em relação ao HPM, veio pelo superintendente do Hospital, o cirurgião buco-maxilar Felipe Barreto. Ele afirma que, por diversas vezes, chega ao HPM acidentados trazidos pelo Corpo de Bombeiros que têm planos de saúde.
- E não é fácil transferir os acidentados para as emergências privadas, pois só têm clínico geral e pediatras de plantão; diferente do HPM, com 19 especialidades. Os números impressionam, enfatiza o superintendente.
Ele lembra que iniciou essa luta ao identificar a dificuldade do HPM em transferir os pacientes que pagavam planos de saúde, internados após receberem os atendimentos emergenciais, para os leitos dispostos nos hospitais que atendem ao setor privado da saúde do município. Conveniados de planos de saúde privados são atendidos no Sistema Público de Saúde Municipal (hospitais, postos e unidades de saúde), deixando de recolher a maior parte do que as operadoras devem ao sistema público.
Nessa linha, ficam questionamentos para o superintendente, como: O que seria dos "beneficiários" de plano de saúde se não existissem hospitais como o HPM? Será que se existisse uma rede privada forte e com especialistas de plantão, o HPM não seria ainda mais eficiente? A lei não beneficia apenas a hospitais como o HPM, mas sim a toda população que deseja, e precisa, se tratada com qualidade, seja na rede pública, ou na privada.
O diretor do HPM informa que o artigo 32 da Lei dos Planos de Saúde (lei nº 9.656/98) prevê o ressarcimento ao Sistema Único de Saúde (SUS), caso o beneficiário do plano seja atendido pelo sistema público (ou por hospital público e conveniado). Isto é, se o paciente resolver comparecer a uma instituição pública ou conveniada de saúde e lá for atendido, a operadora do plano de saúde da qual o usuário é conveniado deverá ressarcir ao poder público os gastos referentes ao atendimento do paciente. Felipe é enfático:
- Queremos chamar a atenção para a necessidade de se definir papéis e assumir responsabilidades. Se é dever do Estado manter os princípios do SUS ao indivíduo, ainda que consumidor de um plano de saúde, caso este recorra ao atendimento público, ele está dentro de seu direito, mas o plano de saúde deve ressarcir ao erário público. Acima de todas as discussões, devem prevalecer os princípios estabelecidos pela Constituição a todos os cidadãos.
Reforçando também o coro dos que lutam pelo reembolso ao erário público dos serviços prestados pelo SUS, está a advogada do Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor (Idec), Juliana Ferreira:
- É dever constitucional ressarcir os hospitais públicos. O setor de planos de saúde é o mais reclamado no Idec há 11 anos, e uma das principais reclamações consiste na negativa de cobertura pelas operadoras de cirurgias, exames, insumos, entre outros. Esse cenário se repete na Justiça, onde a quase totalidade dos conflitos entre usuários e operadoras de planos de saúde dizem respeito à negativa ou limitação de cobertura.
Como a advogada ainda esclarece, a recusa de cobrir procedimentos, principalmente aqueles que demandam altos custos, é prática reiterada das operadoras de planos de saúde, o que acaba por “empurrar” os consumidores para o SUS, que presta um serviço para o qual as empresas privadas já foram pagas e têm o dever contratual e legal de prestar.
- Os planos de saúde não representam uma solução para o problema da saúde no Brasil. E, mesmo os países ricos questionam cada vez mais esse modelo que encarece os sistemas de saúde e não contribui para melhorar a qualidade da assistência. O fato é que o brasileiro paga duas vezes pela saúde e não está nada satisfeito com o que recebe em troca. Todos pagamos impostos e temos direito ao SUS. Da mesma forma, todos contribuímos com o financiamento dos planos de saúde, seja pagando diretamente a mensalidade ou, de forma indireta, arcando com os custos dos planos coletivos empresariais que estão embutidos nos produtos e serviços consumidos por toda a sociedade, enfatiza a coordenadora do Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor (Idec), Marilena Lazzarini, que ainda propõe a participação da população em defesa do SUS, “que não só é viável, como está longe de ver esgotadas as possibilidades de garantia da saúde plena para todos.”
O Sistema Único de Saúde (SUS) responde pelo atendimento da imensa maioria dos brasileiros. Até mesmo a parcela (20% da população) que consegue pagar um plano de saúde ou trabalha em uma empresa que oferece um plano coletivo aos seus empregados, recorre com frequência ao SUS. Diversas pesquisas de opinião revelam que quem conseguiu ser atendido pelo SUS ficou satisfeito com a atenção recebida. No caso dos planos de saúde, sempre que o atendimento é mais complexo ou mais caro, ou sempre que o usuário é idoso ou portador de alguma patologia ou deficiência, os planos colocam muitas barreiras Como visam o lucro, os planos preferem os jovens e sadios e “empurram” para o SUS tudo que é oneroso. Assim, o ressarcimento ao SUS deve ser visto como mais um meio para combater a prática abusiva e ilegal de recusa de cobertura pelos planos de saúde.
Como informa a Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS), hoje atuam no Brasil mais de 2.000 operadoras, que atendem cerca de 36 milhões de pessoas e movimentam em torno de R$ 35 bilhões por ano. A agência ainda esclarece que há vários tipos de planos de saúde: medicina de grupo, seguro saúde, cooperativas médicas, planos de Santas Casas e planos de autogestão, próprios de empresas.
O Secretário de Saúde do Município, Eduardo Cardoso, também se posiciona: “É uma luta que o HPM encampou, e totalmente apoiada pela Secretaria de Saúde. Hoje, os planos privados da cidade usufruem dos serviços de saúde públicos do município e não respondem com nenhuma contrapartida. Dou o exemplo da Unimed que, atualmente, no município, não tem emergência nem especialistas de plantão, além da demora no atendimento. Isso não é justo, pois você paga pelo serviço e quando necessita não tem atendimento.”
O secretário ainda afirma que a Unidade de Pronto Atendimento (UPA), na Barra está sobrecarregada de usuários de planos de saúde. E questiona: “Até quando os planos de saúde instalados no município vão agir desta forma? Será que estão absorvendo mais novos usuários pagantes do que o plano suporta? Isso tudo é muito grave. Temos sim uma vocação regional em atendimento, mas é inadmissível que a Unimed-Macaé não tem ortopedista de plantão?”, questiona
Esta e outras discussões vêm sendo tratadas nas reuniões do Conselho Deliberativo da Fundação Hospitalar, que fazem parte além do HPM, o Hospital da Serra e a Estratégia Saúde da Família (ESF). Como diz o presidente do Conselho Municipal de Saúde de Macaé, Sebastião Piraí de Paula:
- A ideia de um consórcio intermunicipal para tratar desta questão do ressarcimento, mas também do controle dos serviços utilizados pelos municípios da região é uma briga antiga. Mas quem está sustentando sozinho toda a utilização do SUS é o nosso município. É fundamental o ressarcimento para o bom funcionamento dos serviços. Para lutar por esse ressarcimento tem que ter muita vontade política do Executivo Municipal e do Ministério Público.
Saúde Pública: direito de todos
A Constituição Federal de 1988 e a Lei Orgânica da Saúde (Lei 8.080/90) definiram a saúde como direito de todos e dever do Estado, criaram o Sistema Único de Saúde (SUS) e determinaram o acesso integral aos serviços e ações de saúde para todos os brasileiros. Antes da Constituição e da criação do SUS, na hora de buscar assistência em saúde, os brasileiros eram divididos em três categorias: aqueles que podiam pagar pelos serviços particulares ou que contavam com assistência médica custeada pelas empresas na qual trabalhavam; aqueles que tinham direito à assistência prestada pelo Inamps, que beneficiava apenas os trabalhadores com ‘carteira assinada’ e seus dependentes; e aqueles que não tinham nenhum direito e recorriam apenas às Santas Casas e outros serviços filantrópicos.
Com o passar do tempo formou-se no país um sistema misto de saúde, composto principalmente pelo sistema público – o SUS – e pelos planos de saúde privados. A Constituição Federal garantiu a participação do setor privado na saúde. Portanto, o lucro pode existir, desde que prevaleça o respeito à saúde e o interesse da coletividade.
Mas não é isso o que acontece, como afirma o presidente da Confederação Nacional de Saúde, José Carlos Abrahão.
A maioria da população – mais de 140 milhões de pessoas – depende exclusivamente do SUS quando precisa de atendimento em saúde. O SUS dá assistência integral para todos os portadores do HIV, renais crônicos e pacientes com câncer; realiza a imensa maioria das cirurgias cardíacas, internações psiquiátricas, atendimentos de acidentados graves; mantém o sistema de urgência e emergência; faz quase todos os transplantes de órgãos e atendimentos de alta complexidade, que são os casos mais complicados. Sem contar toda a distribuição de medicamentos, ações de vigilância sanitária, campanhas educativas de prevenção, de vacinação e controle de doenças e epidemias.